No início do processo de produção destes perfis, eu e Victor Sousa, responsável pela comunicação do LABxS, combinamos de fazer um retrato de cada um dos participantes. A proposta, ideia de Victor, era que cada um fosse fotografado com um objeto representativo de sua vida, arte, cotidiano. Alguns retratos foram feitos durante os três dias de imersão inicial da Colaboradora, entre eles o de Michael. No corredor de entrada do Lab, conversava com o rapaz de bermuda jeans, camisa cinza, boné preto e óculos no intervalo das atividades. Comentei da fotografia: “Hmn, não trouxe nada em especial, mas tô com a minha câmera aqui na mochila. Não vivo sem ela, acho que me representa muito bem”. Fomos ao pátio nos fundos da construção situada na Sete de Setembro 52, Michael tirou a câmera de sua mochila e posou para Victor na imagem acima, mirando o fotógrafo do LABxS com sua Nikon D5100 comprada em novembro de 2017.
Novembro de 2017. O mês da compra da máquina de Michael, estudante de Letras na UNIP, também marcou o início de sua autonomia no trabalho com a fotografia. Com a Nikon, passou a documentar em imagens shows que frequentava, em especial da cena rap e rock da Baixada Santista, e fazer disso uma importante ferramenta de expressão. Boa parte desse material está disponível em sua página no Facebook, MK Xavier, e na DestroyedMob, um grupo que organiza festas e faz música Trap – uma vertente do rap muito popular nos últimos anos – em Santos e que tem Michael como seu fotógrafo desde janeiro de 2018. Antes disso, Mika (como se identifica no Instagram) já fotograva a partir do incentivo do tio de um amigo, que lhe ensinou algumas noções de enquadramento e ofereceu emprego quando Mika foi expulso da casa dos pais. “Fui expulso porque queria fazer arte”, disse ainda no corredor do Lab, quando perguntei por sua família em Santos. Para pagar as contas e a máquina, Mika também trabalhou despedaçando e arrumando sofás numa tapeçaria durante 2 meses, entre outros jobs.
Além da fotografia, Mika – que também se identifica como MK – escreve poesia e canções, solo ou em grupo. Participa da cena de slams em Santos com textos confessionais, rimas que refletem a vida e o cotidiano de um homem de 22 anos buscando se encontrar e fazer de seu mundo um lugar mais livre e saudável para se expressar. Compõe músicas junto de sua banda, Névoa, que formou com a cantora e compositora Gabriela Cavalcanti. Misturam rap, pop e rock com letras diretas sobre suas vidas, como na música “Terra”, a primeira lançada pelo duo e que ganhou um clipe, em maio de 2018. Na música, as vozes dos dois, embalada por uma melodia melancólica baseada no teclado, trata de males que, segundo eles, afligem a todos no século XXI, como a depressão – que no clipe é representada pelos cantos de Gabriela – e a ansiedade, na voz de Mika. É a primeira música lançada do EP “Elementares”, que vai retratar, em cada canção, um desses males.
Como muitos jovens com contato desde cedo com a internet, Mika/MK/Michael é multiplo até na forma de ser identificado. Transita com facilidade entre a poesia, o rap e a canção em voz e violão; se expressa tanto em slams de poesia, tradicionalmente realizados na rua ou em praças, quanto em lugares fechados, boates, clubes e casa; em grupo, duo ou com mais gente, e também sozinho, como fez com a poesia que falou no Sarau de encerramento da imersão da Colaboradora, em maio de 2018. A letra, também escrita por ele, diz:
ela me vira do avesso
me faz coisa que nem sei se eu mereço
e eu reconheço o recomeço
de quando ela entrou na minha vida
de retrocesso
e eu expresso por meio de texto
todo esse progresso
meu peito expande como o universo
uma supernova a cada verso
em cada sorriso seu uma galaxia
e a via la que te amar é mais
que estar é conquistar
tipo ragnar vou te desbravar
além do horizonte
avisa o caronte
que é contigo que vou atravessar
os mares do submundo ou qualquer outro lugar
não vou esperar mais um vida
espero que entenda faz o favor
não é uma lenda, conto ou o mito,
é só o que resta do meu amor
meias palavras não completam frases
vidas perdidas nao completam fases
mascaras vivas nao combrem mais faces
e eu espero que tudo isso passe
Ela se foi como tempestade
Sua presença é uma miragem
Tipo um choque na realidade
Me atingiu 200 voltagens
Como agua viva seu toque arde
E sem despedida sua falta parte
To vivendo a espera de um milagre
Naufraguei em meio a todos seus males
Sao 7 mares 7 chaves
Um sentimento sem testar pares
Uma experiência digna de Einsten
Eternidade = Me Cativares
Elevado ao quadrado
Me leve a marte
Que eu vou amar-te
Então nos resgate
Antes que o mundo entre em desastre
Nostradamus e nosso apocalipse
Nos tramamos um destino admirável
Mas afundamos como titanic
Como falharam os Maias no calendário
Nossa história virou memória e esse museu está fechado…
Foi transitando nessas áreas que ficou sabendo da Colaboradora, a partir do amigo Vinícius Silvino, ator e músico de 25 anos que participou do Circuito LABxS. Sua expectativa no Lab é a de desenvolver seus projetos pessoais e ajudar no que for preciso os outros colaboradores. “Acho muito maneiro essa rede de conexões, creio que só vai gerar bons frutos”.
PROJETO
O Doc “Batalha do Mercado: Uma guerra contra a marginalização” é um registro de como o Rap e a Batalha de rima podem refletir o contexto social do bairro e também apresentar a visão do rapper sobre a sua realidade e dos moradores sobre o que acham do movimento.